A Intentona Comunista em Canguaretama

Após primeira guerra mundial havia na Europa duas propostas políticas: o Fascismo e o Comunismo. Essas propostas Influenciaram o surgimento de dois movimentos políticos no Brasil: a AIB e a ANL.
A Ação Integralista Brasileira (AIB) surgiu em 1932, sob a liderança de Plínio Salgado. De extrema direita, os integralistas combatiam fervorosamente o comunismo, sendo reconhecidos como de tendência fascista.
O Partido Comunista Brasileiro (PCB) já existia desde 1922 e estava ligado ao movimento operário, ainda muito fraco e restrito às áreas urbanas das cidades mais desenvolvidas. O PCB incentivou a fundação da Aliança Nacional Libertadora (ANL), um movimento político radicalmente oposto à Ação Integralista Brasileira. O PCB era apenas um dos partidos que integrava a ANL e isso não significava, que como um todo, ela apoiasse o comunismo.
Em 1935 Luís Carlos Prestes lançou um manifesto de apoio à ANL, no qual incentivava uma revolução contra o governo. Este foi o estopim para que Getúlio Vargas decretasse a ilegalidade do movimento, além de mandar prender seus líderes.
Nesse contexto eclode, em novembro de 1935, a Intentona Comunista uma rebelião contra o governo de Getúlio Vargas, liderada pela Aliança Nacional Libertadora (ANL), mas que foi rapidamente combatida e eliminada. O movimento ganhou adeptos entre os militares de baixa patente inclinados ao comunismo, que iniciaram a rebelião na noite do dia 23 de novembro de 1935, em Natal.
No Rio Grande do Norte os revolucionários chegaram a tomar o poder durante três dias. Depois se estendeu para Maranhão, Recife e por último para o Rio de Janeiro, no dia 27. O plano de uma revolução foi uma ação foi planejada dentro dos quartéis e colocada em prática com o apoio da União Soviética , que enviou dinheiro e agentes para o Brasil. Foi a primeira tentativa de um governo comunista na América.
Os líderes, que deram início às rebeliões em 23 de novembro de 1935, imaginavam que a revolta ganharia o imediato apoio popular, mas isto não ocorreu. Além do mais, não houve sincronia entre os grupos locais, com as revoltas ocorrendo em datas diferentes em diversos pontos do Brasil. Isso facilitou as ações do governo para dominar a situação e frustrar o movimento.
De Natal o movimento se estendeu para o interior e atingiu em torno da metade dos municípios do Rio Grande do Norte, 41 na época. Na madrugada de 24 para 25 de novembro tomam as cidades de São José de Mipibu e Arês, depois partem para fazer o mesmo em Goianinha.
No final da manhã do dia 25 chegam a Canguaretama. Comandados pelo Tenente Rangel , um batalhão de aproximadamente 80 homens entra na cidade. A prefeitura foi rapidamente invadida e o prefeito destituído. Não havia como resistir a um ataque surpresa de homens bem armados diante de um contingente policial inexpressivo. A cadeia pública foi tomada e os presos foram libertados.
Agindo durante a tarde, Rangel nomeou um novo prefeito, Fernando Dias Abreu, o secretário da prefeitura, o delegado de polícia e o tabelião. Ainda requisitou 500 mil réis da prefeitura e 400 mil réis da mesa de rendas . Pernoitando em Canguaretama, montou uma barreira na ponte sobre o rio Pituaçu, em frente a delegacia pública.
Quase toda população procurou abrigo na zona rural ou em áreas florestais para se proteger de um eventual tiroteio. Poucas pessoas permaneceram na área urbana, pois havia o medo de um confronto entre a polícia e os revoltosos.
O povo não sabia o que era comunismo nem entendia o que estava acontecendo. Numa época de instabilidade política, muitos confundiram os comunistas com os aliancistas e se colocavam contra ou a favor de acordos com as necessidades imediatas. Alguns comerciantes teriam até aberto as portas de suas lojas calculando ganhar a confiança e participar de um possível governo.
Alguns desmandos ocorreram pela falta de experiência administrativa e sensibilidade política. Uma padaria foi ocupada e os manifestantes passaram a doar pães, porém a manobra foi mal sucedida e não teve o efeito desejado. A população que recebeu mercadorias, especialmente alimentos e tecidos, foi duramente investigada. Foi uma época propícia para a delação.
Saindo na manhã de 26 de novembro, a tropa comandada pelo Tenente Rangel tomou o destino da cidade de Pedro Velho e do povoado de Montanhas. Passando pela fazenda Bom Passar, teria ocorrido uma escaramuça na casa do proprietário, Otávio Lima, que não estava no local.
Em 26 de novembro, os líderes perceberam que a situação era insustentável e iniciaram a fuga. Na noite, se dividem em três grupos e se retiram de Natal. Lauro Lago, José Macedo e João Batista Galvão, que pertenciam a cúpula do movimento, chegam a Canguaretama ainda na madrugada e esperam o amanhecer na casa de Nizário Gurgel.
Esses líderes mantinham ligações com o Partido Comunista e teriam recebido ordem para iniciar a ação. A intenção era alcançar a cidade de João Pessoa, mas ao tomarem a estrada encontram uma tropa militar que vinha da Paraíba para combater a revolta em Natal e foram presos.
A desconfiança e o revanchismo tomou a sociedade. Em todo o Rio Grande do Norte as perseguições foram uma constante, com as autoridades se justificando em derrotar o sistema estrangeiro que queria tomar o Brasil. Criou-se, então, uma característica cultural de temer e desprezar as tendências políticas de esquerda desde então.
Os irmãos Arnaud e Oscarina são lembrados pela atuação que tiveram em favor do movimento comunista no município. Não se sabe por que esses nomes foram tão lembrados se tantos outros também participaram. Eram filhos do mestre-de-obras José João da Silva, conhecido como Zé Ponche, que possuía um pequeno sítio no caminho para Barra do Cunhaú.
Em Canguaretama existiu o primeiro sindicato do Rio Grande do Norte, a Sociedade Beneficente dos Artistas, que Zé ponche deveria fazer parte. Mas certamente não foi essa influência do pai que o colocou num movimento radical de esquerda.
Arnaud passou a infância em Canguaretama, mas saiu jovem para assumir um posto militar na capital. A doutrina deve ter sido recebida no quartel, onde teve início o movimento. Na época, o governo recém empossado tinha demitido os policiais sem pagar salário e havia um clima de radicalização muito forte na política potiguar.
A amizade com o Tenente Rangel foi um fator muito forte para tanta lembrança. Oscarina, sua irmã, lhe deu apoio imediato. Ela era mulher de atitudes avançadas e incompreendidas para sua época. Seu nome não foi citado nos inquéritos policiais.
No processo número 12 foi aberto para apurar a atuação dos rebeldes em Canguaretama aparecem os seguintes nomes: Antenor Pedrosa, guarda civil, absolvido; Arnald José da Silva, 6 anos e 6 meses de prisão; Claudionor Ramos; Floriano Saraiva Moura, funcionário público, 5 anos de prisão; Francisco R. do Nascimento, artista, 5 anos de prisão, João Arari Calafange, agricultor; João Francisco, absolvido; João Monteiro; João Peixoto; João Pinheiro, agricultor; João Severino Batista; João Xavier de Lima; Joatan Rodrigues, comerciante; José de Albuquerque Santos, 5 anos de prisão; José de Almeida Pequeno, agricultor; José Carvalho da Silva, industrial; José Flor; José Inácio, 5 anos de prisão; Jovino de Oliveira Fagundes; Luiz Mangabeira, artista; Luiz Raimundo Martins, agricultor; Luiz Valença Sobrinho, 5 anos de prisão; Manoel Francisco de Andrade, agricultor; Manoel Veríssimo, 5 anos de prisão; Mario Gouveia; Miguel Viana, absolvido; Nizário Gurgel de Oliveira, dentista, 2 anos de prisão; Oscar Alves Maciel, sargento do 21º BC, 5 anos de prisão; Oscar Mateus Rangel, tenente da polícia militar, 8 anos de prisão; Pedro Ambrósio Filho; Pedro Cavalcante Neves, funcionário público; Pedro Martins Soares, operário, 5 anos de prisão; Raimundo Mangabeira, absolvido; Romário Calafange, funcionário público; Rubens Câmara, funcionário público; Salomão Saraiva; Severino Fortunato, jornaleiro; Valfredo Gondim, 5 anos de prisão; Virgião Clitano, agricultor, absolvido.
Após a derrota, a repercussão nacional fez Getúlio Vargas decretar estado de sítio e promover uma forte repressão aos envolvidos. Luís Carlos Prestes, mentor do movimento, foi preso, bem como vários líderes sindicais, militares e intelectuais. Mas tudo isto não passou de estratégias do presidente para preparar um futuro golpe e instaurar o Estado Novo, em 1937.

Comentários

  1. Mais um componente histórico importante para a história do RN: a intentona comunista em Canguaretama. Fatos consideráveis e fundamentais para entender a história de um povo. Parabéns pelo blog que, da mesma forma que o meu, são veículos de comunicação que resgatam a memória do povo não deixando desaparecer. Os relato de memória do povo é um dos grandes patrimônios histórico e cultural que deve ser registrado.

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  2. A memória da nossa gente é forte fator de construção da identidade cultural, tão diluída pelo domínio europeu. Inserir Canguaretama no contexto dos fatos históricos do Brasil e do mundo ajuda a construir essa identidade e a compreender o papel que tivemos nesses eventos tão decisivos.

    A iniciativa é eminente e enriquece a imprensa independente, da qual fazemos parte, por estarmos usando esse novo veículo de comunicação para falar sobre fatos passados e presentes. Esse meio não tem hierarquia, não tem patrão, presidente e nem chefe redator pra dizer o que podemos ou não escrever. Por isso conservar a independência desse meio é o mesmo que preservar a nossa memória.

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  3. Olá Francisco!
    Sou um membra da família CALAFANGE e gostaria de saber se, em meio as pesquisas da cidade de Canguaretama, se consegue descobrir origem e chegada da família ao Brasil.

    Obrigada!

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