O NEGRO DO BUEIRO DO ENGENHO



No engenho Outeiro, em Canguaretama (RN), depois que foi adaptado para funcionar com um motor à vapor, os trabalhadores passaram a reclamar de acontecimentos sobrenaturais. Eles se queixavam principalmente de um negro que aparecia fumando nas bordas do bueiro e de gritos que ouviam quando era acionada a caldeira.

Assustados, os trabalhadores se negavam ao serviço ou não completavam as tarefas. Diziam que viam aparecer um demônio no engenho e ficavam apavorados. O proprietário do engenho, para solucionar o problema, procurou os freis Herculano e Guardioso, que pregavam na região.

Para espantar as aparições misteriosas, os missionários pediram que instalassem no local um sino e uma cruz. Para tanto organizaram uma procissão com todos os moradores do engenho para trazer os objetos sacros da capela de Cunhaú. Na base do bueiro do engenho foi feito um nicho para abrigar uma imagem de São Caetano.

Os missionários faziam missas e novenas diante do cruzeiro e o sino passou a chamar os trabalhadores para o trabalho. Depois disso, a vida voltou ao normal. Nenhuma assombração apareceu desde então.

O uso das máquinas e das novas tecnologias significou uma mudança muito grande para os trabalhadores daquela época. Se realmente viam e ouviam alguma coisa sobrenatural, não podemos duvidar. Entretanto, certamente deveriam demonstrar algum incômodo e dificuldades com nova tecnologia e medo do novo.

Esse incidente foi também o primeiro movimento operário caracterizado como greve na região. Diante das máquinas, os trabalhadores devem ter se sentido mais explorados, além de ter que se submeter a outro ritmo de trabalho controlado por ciclos não naturais.

Os operários do engenho agiram muito semelhantes aos luddistas do início do século 19 que, revoltados com as condições de trabalho, quebravam as máquinas. 

O papel da Igreja foi muito importante para acalmá-los e mostrar que aquilo não se tratava de magia, era apenas tecnologia. A cultura popular, com os cantadores, recriou essa narrativa em uma das músicas do Coco de Roda que dizia:

Eu vi o negro

Sentado no bueiro da usina

O danado fumaçou

E o diabo caiu de cima...

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