O MISTÉRIO DAS BOTIJAS DE CANGUARETAMA



É da crendice de muitos que algumas pessoas teriam o estranho
hábito de deixar enterrado um presente de valor monetário para alguém. Esses estranhos presentes, conhecidos como botija, ficariam ocultos a todos os vivos e só deveria ser desenterrado quando o tal doador morresse ou indicasse um sinal. Para muita gente ainda existiria ouro e prata em moedas ou barras que foram deixados pelos holandeses ou escondidos por gente rica e mesquinha. Os relatos desses tesouros escondidos sempre mexem com o imaginário das pessoas.

Em seu Dicionário do Folclore Brasileiro Luís da Câmara Cascudo diz que o tesouro enterrado é um mito presente em quase todas as partes do mundo civilizado e que no Nordeste recebe o nome de botija. O conjunto de superstições e crenças que envolvem o assunto das botijas é um assunto vasto dentro da cultura popular. Quase todo brasileiro sabe uma regra para arrancar uma botija, pois já ouviu alguém falar sobre o assunto.

Há em princípio uma aparição, preferencialmente em sonho, durante a noite. O balançar da rede pode ser um sinal. Geralmente alguém diz: Eu tenho uma coisa para você, vá lá buscar. Ou ainda: quer ficar rico? ...me acompanhe. Depois, apontando para um local, explica exatamente onde está a botija. Nesse momento se escuta: Cave aqui e fique rico. Depois desaparece. Seriam almas penadas, condenadas a sofrer nas chamas do Inferno enquanto  o ouro escondido em vida não for encontrado. Por isso, parte do tesouro encontrado seria destinado às missas pelo defunto. Quando não desenterrado o tesouro, então aparecem coisas estranhas durante as noites, como um fogo que não queima, gemidos, sons de passos. Quando em algum lugar começavam a aparecer essas coisas, o povo logo diz: Ali tem uma botija. Enquanto ela estiver enterrada, a alma do defunto não encontra paz, fica vagando até encontrar alguém que queira receber o tesouro.

Quem recebe uma botija deve arrancá-la sozinho e não demonstrar medo enquanto estiver cavando, pois é nessa hora que até o Satanás vai ao local para atrapalhar a pessoa. Também não pode demonstrar ambição, caso contrário, o tesouro se desfaz e a alma do avarento que enterrou a botija pode ser condenada ao suplício do Inferno. É preciso ir à noite, sozinho, sem falar com ninguém, em silêncio e desenhar o signo Salomão (a estrela de seis pontas) no chão, antes de começar a cavar. Tem que ter respeito e não pronunciar palavrões. Se revelar a outra pessoa, o tesouro some. Se alguém souber e se atrever pegar a botija, não encontra nada, no máximo uma panela velha cheia de carvão em lugar do tão cobiçado ouro. A botija pode estar em local que jamais o afortunado tenha ido. As mínimas orientações já são suficientes. Na maioria das vezes, a alma fica esperando e apontando para o lugar correto.

Depois de passar por essa prova inicial e pegar a botija para si, é necessário ir morar em outro município, em outra residência ou inverter as posições da porta e da janela da casa em que mora. Quem não seguir as orientações teriam a vida abreviada, morreria antes do tempo indicado pelo destino de cada um. Se a botija for desenterrada com êxito, desaparece a assombração, pois a alma alcançará enfim o descanso eterno.

http://gazetaweb.globo.com//Fotos/Noticias/261213moeda5.jpgNa verdade, o hábito de esconder botijas é produto de períodos conturbados da história, quando a instabilidade política e conflitos militares faziam com que os senhores ricos escondessem suas fortunas temendo perdê-las. A isso se alia o regime patriarcal que predominava nas famílias brasileiras até o início do século XX. Dessa forma, as mulheres geralmente ficavam excluídas das atividades econômicas da família. As transações financeiras eram feitas apenas pelos homens, ficando as mulheres sem saber dos bens materiais que a família possuía. Até o início do século XX, quase todo o dinheiro circulante era em moedas, que os senhores guardavam muito bem. Eram colocadas em potes ou em malas e, por segurança, enterradas. Em muitos momentos, embora precisassem usá-las em necessidade própria, esqueciam ou perdiam a vontade de gastar esse recurso, que continuava guardado. Na época os investimentos não eram tão diversificados e o dinheiro não se desvalorizava como nos tempos atuais. Guardar poderia parecer um bom investimento. Acontecia, então, que, ao morrer, muitos desses senhores deixavam seus tesouros sem que ninguém soubesse onde estava.

É importante dizer que, de acordo com a lei brasileira, as botijas fazem parte do patrimônio histórico do município e devem ser devolvidas com a orientação de um especialista e documentada para não ocorrer fraude.

Em nossa região, são muitas as estórias dessas botijas. Algumas são fantásticas e muita gente afirma já ter recebido, em sonho, a doação de uma botija. No engenho Cunhaú as histórias de botijas eram tantas que o proprietário precisou colocar um funcionário exclusivo para vigiar as imediações da capela de Nossa Senhora das Candeias.

Uma vez, chegou um indivíduo pedindo um terreno para fazer um roçado no Cunhaú. O encarregado desconfiou pela condição dele e disse que ele não tinha necessidade de trabalhar na agricultura para sobreviver. Mas ele insistiu dizendo que tinha vontade de comer um feijãozinho verde.  Continuando, pediu um pedacinho de terreno, mas queria perto de um açude antigo que existia por lá. O dito açude já estava danificado e sem uso e o mato já tinha invadido tudo. Entretanto, nesse local, depois de arrancar as aningas, o indivíduo preparou a terra como quem iria plantar. Poucos dias depois, abandonou o serviço e desapareceu. No local ficou apenas um buraco, evidência da botija que teria achado.

Já a botija da lagoa do Tacho era tão grande que foi preciso um boi de carroça para puxá-la. Na iminência de não conseguir arrancá-la, o infeliz escolhido passou a maltratar o boi e amaldiçoá-lo. Diante do seu desespero o tesouro teria se transformado em fezes.

Os carreiros do Pituaçu teriam achado uma botija na fazenda Bom Passar, quando juntavam estrumo no curral. Pouco conheciam de dinheiro e inocentes, pegaram as moedas e barras de ouro, colocaram no chapéu de couro e levaram para casa na intenção de usá-los como fixas na colheita do coco. Ao perceber do que se tratava, o patrão teria recolhido o material e deu-lhes uma pequena quantia em dinheiro. Foi o melhor tempo que viveram. Mas em poucos dias estavam misteriosamente mortos. Um deles, embriagado, caiu quando guiava o carro de boi e foi esmagado pela roda. Essa botija teria sido enterrada novamente na base do bueiro do engenho.

A mais famosa botija ficou conhecida como a Mina do Francês. Nesse local, um pescador teria desenterrado um imenso tesouro. Estaria enterrada na margem do rio, num local que ficava coberto com a maré alta. Esse pescador trabalhava na salina durante o dia, mas pescava amorés durante a noite. Diziam que ele teria poderes sobrenaturais e via tudo no meio do manguezal, mas ninguém conseguia vê-lo pescando. O primeiro sinal da botija foi um suposto revolver de ouro, que a alma mandou que jogasse na água. A quantidade de ouro era tão grande que ele não tinha nem onde guardar. Para não enterrar novamente, ele foi obrigado a entregar as barras de ouro a uma pessoa de sua confiança. Quatro meses depois, ele teria falecido misteriosamente e deixado o tesouro para outro.

Era desse Porto do Francês que se embarcava boa parte do açúcar de alguns engenhos como o Pituaçú, Torre e Cunhaú. Havia um caminho enxuto pelo meio do mangue, por onde passavam os carros-de-bois carregados. A denominação do Porto do francês, segundo o censo comum, surgiu por que era naquele local onde os mesmos escondiam o ouro usado nas transações comerciais que faziam na região. Nesse local haveria vários tesouros, sendo alvo de muitas especulações. O mais provável é que o local tenha servido para o contrabando do açúcar da região, burlando a fiscalização. Esse contrabando deveria ser feito por um francês ou outro estrangeiro assim reconhecido.
 

Comentários

  1. Seis vizinhos meus desenterram um caixote, um dos seis levou o caixote e ficou so pra ele.

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  2. Eu já morei em uma casa com botija Outra pessoa encontrou Minha mae vi muita assombração A casa era em uma fazenda na cidade de Queimadas PB

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