A carta de amor de Augusto Severo

Como bem disse Luiz da Câmara Cascudo, estamos habituados a ver Augusto Severo no passadiço do Pax, em glória, voando para a morte. O balão esconde o homem, oculta-o, disfarça-o, deforma-o em sua consagração trágica. O Augusto Severo, homem, apaixonado pela vida, por sua terra, por seus amores, parece querer sumir. Segundo sua sobrinha escritora Mabel Tavares, Severo conquistava sem querer o coração das jovens sonhadoras. Possuía as qualidades admiradas pela juventude de seu tempo: fidalguia de maneiras, belo porte, bom de dança, sorriso sempre franco.

Mabel chega a enumerar algumas paixões do jovem Augusto Severo. Em São José de Mipibú, de passagem no trem, sorria às jovens na estação, destacando-se uma – Bela, cujo verdadeiro nome nunca saberemos. Em Canguaretama, era o enamorado das “mãos fidalgas” da jovem Nana. Na Macaíba, ficou conhecidíssimo seu amor por Maria Júlia Pessoa de Mello, filha do Comendador Umbelino de Mello, inimigo politico dos Albuquerque Maranhão. O namoro foi sustado. Maria Júlia nunca se casou e Severo, depois de ter ido para o Rio de Janeiro estudar, voltou porque enamorara-se de sua tia materna Maria Nazaré, filha do terceiro casamento do seu avô Fabrício Pedroza.

Em Canguaretama, no engenho Ilha do Maranhão, em casa de seu irmão Fabrício Gomes de Albuquerque Maranhão, conheceu a professora de seus sobrinhos – Maria Amélia Teixeira de Araújo. Apaixonado, não esperou o retorno de seu pai que viajava e ele mesmo, quebrando os tabus da época, escreveu a mãe de Maria Amélia, rogando-lhe permissão para namorar sua filha, numa carta emocionante que transcrevemos abaixo:

Exma. Sra. D. Inês Perpetua Teixeira de Araújo

Minha Senhora,

Peço-lhe vênia para ir a sua presença, tratar do que hoje profundamente me interessa, eu que não posso apresentar títulos que me recomendem perante a senhora; nem mesmo os de um ligeiro conhecimento pessoal.

Vi-a, é verdade, tive o prazer de lhe ser apresentado em abril de 1885, em casa do meu cunhado – Juvino; mas então nem sonhava que tivesse de pedir-lhe, de implorar-lhe, o que ora peço e imploro.

Como recomendação única, levo o mais nobre, o mais santo de todos os sentimentos – flor do céu a que Deus permitiu a vida na terra – o Amor.

Inspirou-me, grande e casto, sua boa filha, D. Maria Amélia; tão grande, tão puro que já não poderei viver sem ele.

Peço-lhe pois a mão dela para minha felicidade, porque cifram-se em as doce posse a realização do mais risonho, do único risonho de todos os meus sonhos, o alento para as boas aspirações de minh’alma, sem a qual sinto que morrerei. Peço-lhe, de joelhos minh’alma, como implorando o céu, que dê o seu consentimento partido do coração, que me aceite a mim por filho; a mim que quase desconhece, mas que lhe juro com a consciência branca – não se envergonhará de ter-me por tal.

De meu pai, que a senhora conhece, e de minha santa mãe, tenho a plena aprovação; deles, que de havê-la por filha hão de orgulhar-se, com o orgulho que não macula, que é antes um bom sentimento quando não leva egoísmo, porque lhe reconhecem todas as virtudes – flores d’alma, que na terra só é dado possuir a mulher perfeita.

Pela precipitação da viagem do meu pai, não o incumbi de por mim pedir a senhora, o que agora pedi; não me arrependi, porém, porque não me podia fazer conhecer mais do que sou, e eu, só eu devia pedir a minha felicidade.

Eu devia apresentar-me pessoalmente para este fim, do qual está pendente toda minha felicidade, o meu futuro inteiro; mas sou empregado numa casa comercial, onde me prendem obrigações tão mais fortes, porque estamos agora em meio de safra, principalmente não tendo como não tem por hora, um imediato que me substitua, por alguns dias.

Poderia ir em abril, quando pretendo ir, mas não teria força bastante para conservar até lá, calcado no coração, o sentimento que precisa de seu consentimento para não explodir.

Por Deus, minha senhora, espero que me dará a posse da felicidade.

Se não fosse impelido pela grande força que rege o movimento dos corações, não me afoitaria a tanto.

Junto uma carta, para cuja entrega peço-lhe permissão.

Suplico-lhe que me responda na primeira mala, que pela resposta fica ansioso meu coração.
Como meu único advogado, o Amor – o sempre grande, o Amor – o sempre casto.

Creia, minha senhora (autorize-me a chamar-lhe mãe; como então eu serei feliz!), no profundo respeito que lhe consagra, e na lealdade de quem só pode ser feliz com a doce posse de sua querida filha – D. Maria Amélia.

Augusto Severo de Albuquerque Maranhão.

Guarapes, 09 de dezembro de 1887.
 
FONTE: http://www.historiaegenealogia.com/

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